Agência Nacional de Saúde Suplementar altera regras de contratos de operadoras de saúde

Por força de decisão judicial, ANS faz alterações nas regras de contratos de operadoras de saúde e prestadores

Entenda o motivo das mudanças nas regras de contratos de operadoras de saúde
Em 2020, tivemos algumas resoluções publicadas por força de decisão judicial e uma delas foi a RN 456/2020, publicada em março/2020 para fins de cumprimento da decisão judicial, especialmente para suspender alguns artigos que estavam contrários às disposições da Lei 9.656/98. Isso levou a alterações nas regras de contratos de operadoras de saúde e prestadores de serviços.

Entretanto, é importante pontuar e entender a intenção da ANS ao regulamentar a matéria, ainda que em dissonância com a própria Lei 9.656/98, como veremos a seguir.


Mudanças nas regras de contratos de operadoras de saúde

O primeiro dispositivo suspenso foi o §2º do artigo 12 da RN 363/2014, que previa no sentido de que “o reajuste deve ser aplicado anualmente na data de aniversário do contrato escrito”, enquanto que o artigo 17-A da Lei 9656 determina que o reajuste anual seja aplicado em até 90 (noventa) dias do início do ano calendário. 

Assim, a previsão original da resolução normativa criava uma certa incoerência com a própria lei, pois o reajuste no aniversário do contrato poderia violar a previsão legal caso ocorresse após o primeiro trimestre.

Com a suspensão do dispositivo, o reajuste entre operadora e prestador deve ocorrer até 90 dias do início do ano calendário. Ou seja, até 31 de março, independente da data de aniversário do contrato.

Nesse sentido e não obstante o fato de que o reajuste deve ser aplicado pelo menos uma vez no ano, faço um alerta quanto à importância de ter na regulamentação disposição para aplicação do reajuste na data de aniversário do contrato. 

Não faz o menor sentido ter que aplicar o reajuste sempre até os 90 dias do ano calendário, por exemplo, em contrato firmado no final do ano calendário. Em vez de o reajuste ser aplicado no próximo final de ano, data de aniversário do contrato, em decorrência da regra prevista da Lei 9656/98, o reajuste deve ser aplicado antes mesmo do contrato fazer aniversário. Portanto, antes dos 12 primeiros meses de vigência do contrato.

Assim, seria muito mais coerente reajustar o contrato na data de aniversário do contrato e não obrigatoriamente no início do ano.

No entanto, ao invés de solicitar aos parlamentares alteração da redação da Lei 9656/98, a agência entendeu por bem regulamentar a matéria. Mas, infelizmente, se deparou com a decisão judicial que, de forma correta, uma vez que contrária à Lei 9656/98, resolveu por suspender os dispositivos da regulamentação do setor contrários à própria Lei. Porém, sem entender direito qual seria a consequência da operacionalização da forma prevista na Lei 9656/98.

Lembrando que a RN 456/2020 teve sua publicação em diário oficial em 31/03/2020, final do prazo para aplicação do reajuste, de acordo com a regra da Lei 9656/98, e sua vigência a partir da publicação. Mas, na prática, especialmente quanto à aplicação do reajuste anual, a regra passa a valer a partir de 2021.

Além disso, ressalto que a RN 456/2020 determina sua vigência de forma temporária e condicionada ao trânsito em julgado de um processo judicial. Isso gera mais insegurança e incertezas na relação entre as partes. Assim, a grande questão será: até quando as operadoras devem aplicar o reajuste nos primeiros 90 dias do ano calendário?

O outro dispositivo que teve efeito suspenso foi o artigo 6º da RN 364/2014, com previsão no sentido de que “na inexistência de contrato escrito entre as partes, não se aplicará o índice de reajuste definido pela ANS”, uma vez que o artigo 17-A da Lei 9656 veda a existência de contratos não escritos, motivo pelo qual o dispositivo foi suprimido.

A ANS até teve uma boa intenção em dispor dessa forma, para deixar claro que, na ausência de contrato escrito, não se aplica o índice definido pela ANS. Mas assim permitiu “de certa forma” a existência de contrato não escrito, o que é vedado pela própria Lei 9656/98.

Lembrando que no meio jurídico é permitido, pelo próprio Código Civil, inclusive, a formalização de contratos não escritos, de forma verbal. Ou seja, não que o contrato entre as partes não exista, o mesmo existe, mas não foi reduzido a termo (formalizado entre as partes), sendo assegurado aos contratos não escritos a mesma validade dos contratos escritos. Entretanto, esse não seria o caso, uma vez que a Lei veda essa prática entre operadora e prestadores.

Não obstante, caso existissem contratos não escritos, seria possível afirmar que referidos contratos também estariam sujeitos às regras dos contratos escritos. Portanto sem haver o que se falar em aplicação direta do índice definido pela ANS, qual seja, o IPCA, assim, dependeria do quanto estivesse estabelecido entre as partes (livre negociação e índice definido). E, caso não tivesse definição do índice, aí sim se aplicaria o índice definido pela ANS. Ou seja, ainda que não tivesse sido formalizado o contrato de forma escrita, se aplicaria as regras gerais dos contratos escritos, sendo assegurado, portanto, o reajuste anual para os contratos em questão.

Contudo, uma vez suspensos os dispositivos, há margem para diversas interpretações. Além do que, como vimos, operacionalmente faz muito mais sentido as disposições como perfeitamente regulamentada a matéria pela ANS.

São as minhas considerações.

 


  Natalie Martins
  
Gerente de Regulação


 


Data da notícia: 17/11/2020

TOP